Estão sentados lado a lado na
escada da porta de entrada da casa. Ela oferece a ele sua boneca Barbie
e o convida para participar da brincadeira. Não tem mistério, vão trocar as
roupas das bonecas, pentear seus cabelos, passear com o carrinho cor de rosa
para lá e para cá. Ele não tem certeza se é correto participar dessa
brincadeira em um universo rosa e tão isento de violência. Está acostumado com
seus brinquedos violentos em tons de azul, suas espadas e vídeo games de
lutas. Ele dá uma espiada para os lados a fim de se certificar que nenhum amigo
da escola está nas redondezas. Barra limpa, pode bancar o motorista da madame.
Enquanto as crianças brincam,
se aproximam delas os pais. O pai dele caminha lado a lado com o pai dela,
quando ele vê o filho brincando de igual para igual com a menina, sente-se
desmoralizado. Seu ímpeto é logo de dar uma dura no garoto. Menino não brinca
de casinha e fim de papo. Mas ali, na frente do amigo, não pode dar esse
vexame, precisa se controlar.
- Filho, vem cá! Vamos jogar um
futebolzinho com o pai?
O menino só balança a cabeça em
sinal de negação. Está gostando da brincadeira. O outro pai percebeu o
desconforto do amigo. Só tinha essa menina como filha. Ao contrário dele, ele
não sabia como era viver em um universo infantil que não contivesse o cor de
rosa.
- Deixa disso filho, vamos
fazer uma coisa de homem! – exaspera-se o pai do menino já sem muita paciência.
Não teria um filho gay sem antes lutar para transforma-lo em homem.
Novamente
o garoto recusa a mudança de brincadeira. Seu pai perde totalmente a paciência.
- Levanta
logo daí e vamos para casa! Filho meu não tem dessas viadagens!
Se o
menino soubesse o que significava a palavra viadagem talvez até se sentisse
ofendido, mas a única linguagem que conseguia compreender era a de que seu pai
estava enfurecido somente por ele estar brincando com a sua amiguinha.
A menina,
que também estava gostando da brincadeira, usa de sua sensatez infantil:
- Tio,
não vai embora! Vem aqui brincar com a gente!
O pai
dela que não era bobo nem nada, aproveitou a deixa para esfriar os ânimos.
Sentou ao lado da filha e praticou com delicadeza a arte de educar através do
exemplo, sejam as crianças ou os adultos.
O homem
fica sem jeito ao ver o amigo tão à vontade com as brincadeiras da filha.
Resistindo um pouco ele aceita participar também. O menino era o motorista do
carrinho rosa e seu pai o mordomo, ela era a maquiadora e o seu pai seu modelo
de testes.
Quando
já era noite e todos foram para casa, o garoto agradece ao pai pela diversão.
Finalmente esse pai descobre que a cor de um carrinho ou o tipo de brincadeira não definem a orientação
sexual de ninguém, pelo simples fato de que não se trata de uma opção.
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