sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Onde está o meu colar

            - Garoto, volta aqui! Me responde, onde está o meu colar? – grita a mulher enquanto com um puxão de orelhas suspende o menino do chão.
            - Você tá louca mãe? Quer desgrudar minha orelha da cabeça? Vou chamar o conselho tutelar e você vai presa! Conheço meus direitos. – o menino protesta e fundamenta de forma brilhante seus argumentos.
            A mãe entra em choque e cede. O garoto sumiu com seu colar, mas que importância tem isso? Embora endiabrado, respondão e arteiro, ele é apenas uma criança. Já ela, o que é ela? Nada além de uma criminosa agindo de forma violeta para com o seu próprio filho.Uma pobre inocente e indefesa criança! Vai para o inferno, não tem dúvidas, e se bobear para a cadeia também. A educação mudou de nome e endereço.
            Enquanto a mulher se corrói em remorsos, o menino já está longe, fugiu para o quarto. Dá uma espiada em direção a porta para se certificar de que a mãe não veio atrás dele, não pode correr o risco de ser pego em flagrante. Tira o colar de pérolas do bolso e o guarda escondido na última gaveta de sua cômoda. Tem planos ousados para usa-lo no futuro. Outro dia assistiu a um filme onde um garoto de sua idade estoura um colar igual a esse da mãe e espalha as bolinhas pelo chão, fazendo um adulto deslizar sobre elas e estatelar-se pelo chão. Muito divertido, teria que fazer igual. Pouco lhe importa se no cinema usam pérolas falsas e o que tem em mãos são verdadeiras. Os fins justificam os meio, em nome da arte é preciso que haja algum sacrifício. Estava tudo jutisficado.
            Absolutamente consumida pela culpa, a mãe entra no quarto e se aproxima do filho. Pede desculpas, jura que nunca mais vai trata-lo de forma tão cruel e desumana. É uma péssima mãe e tem consciência disso. Ele pode lhe pedir o que quiser, ela lhe dará de bom grado e coração aberto. Ele é um bom menino. Ela o ama. Que façam as pazes. O garoto faz cara de quem está considerando a proposta, muito embora achasse o puxão de orelha coisa pouca perto do que pode vir pela frente, não era possível que aceitasse assim tão rápido a proposta da mãe. Há que se fazer de difícil. Está com a faca e o queijo na mão. A constituição está do seu lado. Não é coisa pouca. Faz caras e bocas. Coloca o dedo no canto dos lábios, como quem diz, não me interrompa,estou a pensar. Até que finalmente se pronuncia:
            - Você foi malvada, mas se fizer um brigadeiro agorinha mesmo, sou capaz de lhe perdoar.

            A mãe sorri. Estava preparada para chantagens piores. Um vídeo game novo ou coisas do gênero. Ela conhecia muito bem o filho que tinha, não era exatamente flor que se cheirasse o danado. Ai, meu Deus! Lá estava ela de novo a fazer mal juízo do filho. Não, não. O menino era um santo, ela a criminosa. Deus que a perdoasse. Não queria ir para a cadeia, digo, para o inferno. Se em matéria de mães diz-se que estas não se enganam jamais, então ela era a exceção. Para o bem da constituição, conselheiras tutelares e orelhas descoladas, não se falou mais nisso.

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